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domingo, 30 de julho de 2023

Roberta Kelly - A Chave - 6º Capítulo






Capítulo Seis

_ Olá. Estou aqui como prometi.
_ Oi. Como foi a cirurgia?
_ Correu tudo bem, mas quem vai te explicar tudo é o Dr. Austin.
_ Vi o Dr. Born sair nervoso da sala. O que aconteceu?
_ Ele queria participar da cirurgia e o Dr. Austin não deixou, dizendo que você preferia um conhecido. No caso, eu.
_ É difícil comer nessa hora?
_ Não. Estou aqui para garantir que você irá se alimentar corretamente. (Risos) Volto já.

_ Ele se demorou pouco, mas foi o suficiente para o Dr. Born aparecer.

_ Olá. Como está se sentindo?
_ Com fome.
_ Vou providenciar algo para você comer.
_ Não precisa, já fiz isso. (Scott havia retornado)
_ Hum... Você.
_ Sim. O Dr. Austin virá vê-la então não há necessidade de você ficar aqui.
_ Volto quando não tiver visitas. (Dr. Born disse para mim e saiu).

_ Com essa discussão Marie acordou. Sem graça, pois disseram que eu só viria para o quarto no dia seguinte.
_ Oi, não sabia que você estava aqui. (Marie tímida por haver homem no quarto enquanto dormia).
_ Também não sabia que viria.
_ Oi Scott. O que se passou por aqui?
_ Nada de mais Marie, não nos damos bem desde a infância.
_ Desde a infância?

_ Quis saber. Desde a infância é muito tempo.

_ Sim. Estudamos juntos e ele sempre dava um jeito de me prejudicar com os professores e os outros alunos.
_ Você sabia que o encontraria aqui?
_ Não pensei nele até encontrá-lo.
_ Por que não se dão bem até hoje? Coisas de crianças deveriam ser esquecidas.
_ Não dá para esquecer se isso te persegue na fase adulta. Quando crianças eu era ingênuo. E sempre que ele fazia alguma coisa errada, chorava e pedia para eu assumir a culpa, pois o pai dele o espancaria até deixá-lo caído ao chão. Eu concordava e apanhava no lugar dele. Depois, quando adolescentes meu pai já havia proibido nossa amizade e isso deixou Born com raiva, pois perdera o apoio nas suas mentiras. Seus novos amigos não mentiam e ele acabava sendo surrado.
_ Mas por que ele ficou com raiva de você? Não foi seu pai quem proibiu?
_ Sim, mas eu tive que colocar fim na amizade e não meu pai. Não satisfeito com isso, ele começou a me prejudicar na escola. Várias vezes eu nem estava presente e ele dizia que viu quando eu fiz isso ou aquilo. Só não fui expulso porque num dia desses estava de cama e a diretoria da escola havia sido informada. Então ele foi pego e meu nome ficou limpo. Mas no doutorado, ele fez muito pior e uma única vez, até hoje tento limpar meu nome. Por isso não tenho permissão ainda para trabalhar como médico. Os diretores estão analisando se tenho condições mentais. Aconteceu algo que levantou novas suspeitas sobre mim e não vejo saída nesse bolo de confusões que Born me colocou. É isso que nos faz ter essas discussões desnecessárias.
_ Que triste. Se eu puder te ajudar de alguma forma, pode contar comigo.
_ Está tudo bem. Quer dizer, eu vou ficar bem.

_ Scott olhou com um jeito que dizia “aqui não dá para conversar”. Senti um calafrio só de pensar em ficar sozinha com ele. Não era medo. Ele até o momento foi o único rapaz que despertou um sentimento estranho em mim. Não conhecia o amor, aliás, não conhecia nenhum rapaz tão educado. E não queria um bruto ao meu lado. Preferiria ir para o Convento. Ele interrompeu meus pensamentos.

_ Marie, você pode voltar a dormir se quiser. Vou fechar a cortina divisória. Tudo bem?
_ Marie olhou para mim procurando ajuda com a resposta. Mexi levemente a cabeça dizendo que sim. Scott não viu.

_ Tudo bem. Se precisarem é só chamar, tenho um sono muito leve.

_ Ele fechou a cortina e sentou-se novamente. Começou a tão esperada conversa com assuntos comuns, pois sabia que Marie ouviria.

_ Como está se sentindo?
_ Estou bem. Ainda estou com o efeito da anestesia.
_ Se aquele médico ordinário te incomodar me avise.
_ Não se preocupe. Ele não voltará tão cedo.
_ Vou procurar saber os horários dele aqui no hospital e virei te ver sempre que ele estiver. Assim ele não terá tantas oportunidades de vir aqui.
_ Sei que já explicou o motivo de não gostar dele, mas por que quer me proteger?
_ Porque gosto de você e sei que ele é um mau caráter.
_ Hum...
_ Talvez fosse melhor nós conversarmos outra hora. Você precisa descansar.
_ Já dormi o bastante por muitos dias. Se quiser ficar acho que Marie já dormiu.
_ Tem certeza?
_ Sim. Ela já dormiu. (Rimos ao ouvir Marie roncar).

_ Por um momento ficamos em silêncio.

_ Na verdade estou sempre adiando porque não sei como dizer.
_ Scott, se for o que estou pensando, eu já sei o que dirá. Sua tia contou a Marie sua triste história de amor.
_ Que terminou em ódio.
_ Não pense mais nisso. Remexer as feridas só as aumenta.
_ Você tem razão. E quanto minha tia, ela adiantou parte do assunto. Estive me preparando para esse momento durante muito tempo, pois sempre tive vontade de encontrar alguém para compartilhar minha vida.

_ “Oh meu Deus! Ele vai se declarar”. Pensei, e junto com esse pensamento veio um suspiro que foi mal interpretado.

_ Se você não quiser ouvir eu posso deixar pra lá. Estou importunando-lhe.
_ Desculpe-me, não foi essa a intenção. Eu espero por alguém que converse abertamente comigo há muito tempo e então você apareceu.
_ Tem certeza que quer que eu continue?
_ Sim, por favor.
_ Minha tia contou exatamente o que a Marie?
_ Disse que sua noiva o deixou para fugir com outro. As pessoas falavam mal de você. E que jamais olhou para outra moça. Os detalhes eu não sei.
_ Ela não devia ter falado sobre isso, mas por um lado foi bom.
_ Ela disse que tem medo de você se apegar a mim já que depois eu irei embora.
_ É tarde demais. E é por isso que pensei em trabalhar em sua cidade. Estando lá talvez fosse mais fácil conquistar a confiança de seus pais e o seu amor.
_ Scott, você mal me conhece, como pode fazer planos?
_ Pensei em passar um tempo com você enquanto está aqui. Mas só se você estiver sentindo o mesmo que sinto por você.
_ Não sei dizer. Nunca pensei em ninguém, aliás, eu ainda vivo como uma criança rebelde, só pensando em aventuras. Além disso, são nossos pais que escolhem os companheiros e não temos direito de dizer não. Vocês homens é que podem recusar ou não uma noiva.
_ E por isso fui abandonado. Meu interesse por Estela era visível, mas meus pais esqueceram de saber do interesse dela por mim. Assim que meu pai morreu, ela foi ficando distante. Minha mãe percebeu, mas não podia voltar atrás com a palavra dada por meu pai. Eu estava cego pela beleza dela, então ela fugiu com quem realmente amava.
_ Não pense assim.
_ Por enquanto preciso. Não quero cometer o mesmo erro.

_ Fiquei paralisada por alguns instantes. Não sabia o que dizer.

_ Vou embora, pois já está tarde e minha tia deve estar preocupada. Fiquei de dar notícias sobre sua cirurgia.
_ Tudo bem. Vou dormir um pouco mais.
_ Até amanhã.
_ Até amanhã.

_ Ele foi embora e fiquei pensando em tudo o que conversamos. Como um ‘acidente’ podia mudar tanto a vida de uma pessoa? Sorri com o pensamento.
Estava quase dormindo quando ouvi passos. Abri os olhos e o Dr. Born estava muito próximo, tanto que podia sentir sua respiração. Virei o rosto e chamei Marie. A intenção dele era clara, ele ia me beijar.

_ Marie? Dr. Born veio dar notícias de minha saúde.
_ Quieta, não acorde sua acompanhante.
_ O que você quer aqui? (Falei alto chamando a atenção de Marie).
_ O que está acontecendo? (Marie quis saber).
_ Só passei para ver como a Srta. Grace está.
_ Não foi o que pareceu. (Marie retrucou).
_ Desculpe-me. Sei que meu comportamento com Scott não é dos melhores. Temos divergências. Acho que ele deve ter contado da maneira que lhe convém.
_ Disse alguma coisa a respeito sim.
_ Imagino.
_ Ele disse algo sim, e você entrou sorrateiramente no meu quarto e tentou me beijar. Então nesse momento eu só penso o seu pior.
_ Não me julgue mal. Eu não resisti, pois você chamou minha atenção desde o momento em que atravessei a porta da sala de atendimento. Seus olhos cor de mel, sua pele clara e sua boca...
_ Dr. Born, controle-se. Não lhe dou o direito de falar assim comigo. Exijo respeito. E por favor, saia do quarto.
_ Desculpe-me. Esperei tanto por você que quase não consegui me controlar. Posso esperar um pouco mais. Durma bem.

_ Não tive tempo de reagir e então ele beijou-me na testa.
Com certeza demorei muito tempo para dormir pensando no que ele quis dizer com “esperei tanto por você”, e claro tive medo que ele retornasse e conseguisse me beijar.
No fundo eu sabia que um dos dois estava mentindo, ou os dois. E ao mesmo tempo escondendo algo muito maior.
Marie ouviu boa parte da conversa e voltou a dormir. Havia algo estranho com ela.
Aos poucos o dia foi clareando e o movimento no hospital aumentando. Estava segura, então adormeci.
Tive pesadelos horríveis com Scott e o Dr. Born. Pareciam tão reais como se fossem lembranças. A época do sonho era distante. As paisagens diferentes, as roupas e o modo das pessoas agirem. Estava no meio de um duelo e senti a aflição da moça do sonho. E para piorar, no sonho eu senti amor pelo Dr. Born. Isso era loucura. Tanto Scott quanto Dr. Born não tinham a aparência que conheço, mas pelo olhar os reconheci de imediato.



;)

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